quinta-feira, 7 de maio de 2009

O garanhão paraguaio

Dias atrás, a mídia noticiou algumas das peripécias amorosas do ex-bispo da Igreja Católica, e hoje presidente do Paraguai, Fernando Lugo. Até agora três mulheres afirmam ter mantido relações sexuais com o ex-clérigo antes mesmo de ele renunciar ao episcopado, fato consumado para que pudesse assumir o governo.


Duas questões importantes devem ser analisadas. Em primeiro lugar a discrepância entre teoria e prática no que tange ao discurso e dogmas católicos. Não bastasse quebrar o voto de castidade, Lugo afirmou que uma das mulheres usava o DIU e que uma “falha” desse dispositivo teria levado à gravidez.


O uso de métodos anticoncepcionais é uma das mais fortes bandeiras da Igreja Católica na atualidade. A Campanha da Fraternidade de 2008 teve como lema “Escolhe, pois, a vida”, numa verdadeira cruzada contra a camisinha, o aborto e as pesquisas com células-tronco. Se nem os defensores da ideia a seguem, como pregá-la ao “rebanho”? Pelo menos desta vez a relação foi consensual e não mais um caso de pedofilia, escândalo que já se tornou corriqueiro. Mas essa não é a única questão.


O Paraguai é um dos países mais pobres da América. Encontra-se, segundo dados da ONU, em 95º em Índice de Desenvolvimento Humano, 71º em alfabetização e 75º em mortalidade infantil. Ostenta também um pífio desenvolvimento industrial e sérios problemas de concentração fundiária e de renda.


Mas os problemas pessoais e até instintivos, no caso de Lugo, se sobrepõem aos problemas de maior importância. A polêmica levantada fornece farto material para a mídia sensacionalista. E esse fato não é singular apenas aos nossos vizinhos.


Um destacado intelectual adamantinense, munido do que ele entende como “ética protestante”, acredita que a vida pessoal do homem público está atrelada ao seu cargo. Segundo esse pensamento a pessoa pública deve dar explicações sobre sua conduta à sociedade. Contudo, ancorado em pouca experiência e menor capital cultural, acredito que a vida privada é algo inviolável, e não domínio público, mesmo que os envolvidos o sejam.


O caso do garanhão paraguaio é mais um exemplo de uma sociedade em crise de paradigmas, fundamentada na defesa de dogmas ultrapassados e anacrônicos, os quais nem mesmo seus defensores seguem. Demonstra também uma mídia obcecada pela vida privada e pelos bastidores, deixando a ética e o bem público apenas nos mal consultados manuais de jornalismo.