segunda-feira, 27 de julho de 2009

A fila dos bancos

Poucos são os momentos de isonomia entre os brasileiros. Num país conhecido pelas grandes desigualdades e pela clara diferenciação entre as classes sociais, as filas são um dos poucos momentos verdadeiramente democráticos.

Nos supermercados, lotéricas, bancos, farmácias, estabelecimentos de lazer, aeroportos, não existe distinção de gênero, credo ou etnia, salvo os atendimentos preferenciais aos idosos, gestantes ou portadores de deficiência. Contudo, as filas dos bancos são um martírio, principalmente para o trabalhador que não tem tempo durante a semana e precisa sacrificar seu horário de almoço. Essenciais para a população, a maior parte dos bancos não oferece um atendimento nem mesmo satisfatório.

Uma rápida passagem pelas agências da cidade mostra as dificuldades por que passam as pessoas. Não menciono nem o tempo de espera, que já foi regulamentado pela lei estadual 10.993/2001, e raramente é cumprida. A discussão a que me remeto é a das condições a que são submetidos os que esperam para pagar suas contas.

A falta de fiscalização em Adamantina gera transtornos inadmissíveis. Filas desorganizadas que às vezes chegam às escadas e até mesmo à rua, colocando as pessoas ao sol, e morosidade no atendimento. Como se sabe, após a venda do Banespa para o grupo espanhol, outra instituição assumiu a folha de pagamento do servidor estadual.

Mas em Adamantina essa instituição não adotou as medidas necessárias para atender ao acréscimo de demanda. Caso semelhante ocorre no banco que se orgulha de estar completando 201 anos, mas que, com reduzido número de caixas, é um dos que mais demoram em Adamantina.

Outro ponto problemático diz respeito ao banco que ganhou a licitação da folha de pagamento do servidor municipal. Apesar de a demanda ter aumentado, parece que pouco esse banco investiu no bem-estar dos usuários de seus serviços e que esperam em pé por um tempo muito longo. Outra questão é o chamado “atendimento preferencial”, que em alguns bancos da cidade deixa idosos e gestantes em pé por mais de 15 minutos, descaso já fartamente conhecido dos vereadores.

Em 2005, os edis Cleusa Francisco e Celso Mastellini, por meio da lei nº 3.140, tentaram regulamentar a situação visando “dar atendimento digno e profissional aos clientes”, mas nem todas as agências locais cumprem essa disposição. Se existe lei, e ela não vem sendo cumprida, cabe ao poder público fazer com que o seja, porque de seu cumprimento dependem milhares de adamantinenses.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Toque de recolher: a terceirização da autoridade

O pensador inglês Thomas Hobbes, pressupondo que a natureza humana seja predatória, defendeu um governo forte e centralizador que pudesse conter os ímpetos individuais e instituísse severas penas àqueles que fugissem às regras e aos costumes ditados pelo príncipe. O monarca, escolhido dos deuses, saberia o que seria melhor aos súditos.

Platão já delegara aos filósofos a plena direção da cidade; criou uma “ditadura aristocrática” pela qual os mais aptos guiariam a plebe. Salvo raros momentos, a humanidade sempre teve defensores da forte regulamentação da conduta humana. Esse pensamento parte da ideia de que o cidadão comum deva ser guiado como um portador de necessidades especiais numa rua movimentada. Os “olhos do Estado” conduziriam a grande massa, que não sabe se portar.

De tempos em tempos esse preconceito ressuscita. Partindo-se do que deve ser o “costume correto”, fazem-se leis tendenciosas, muitas vezes inspiradas em modismos, sem uma reflexão mais acurada. Formulam-se comportamentos padronizados, os quais todos devem acatar. Nessa liberalidade enquadra-se o toque de recolher.

Alguns legisladores e uns poucos formadores de opinião, partindo de convicções pessoais sobre a conduta correta da juventude local, classificaram como providencial a limitação de horário para a presença de adolescentes nas ruas da cidade. Alguns pais, usando a lei como muleta pedagógica, sentem-se amparados pela participação do Estado na criação dos filhos. E corre-se o risco de se terceirizar a autoridade.

A liberdade individual e a vida privada são fundamentos da democracia. Autorizar o poder público a regular a criação dos filhos é perigoso, pressupõe que os pais não podem fazê-lo e que seus filhos devem ser tutelados. O Estado de fato tem o direito de regular a conduta dos cidadãos, mas desde que haja alguma infração ou exista risco para o indivíduo ou para a comunidade. A imposição de horários para circulação de pessoas nas ruas infringe o direito de ir e vir, o que é concebível apenas em situações de exceção.

O toque de recolher é uma medida paliativa para cidades que têm sérios problemas de violência e drogas, o que não é o caso de Adamantina. Já existem outros mecanismos para regular a vida dos jovens da cidade, que saem à noite com a concordância dos pais. E é dever dos órgãos públicos municipais fiscalizar a entrada dos adolescentes em estabelecimentos inapropriados à sua idade, bem como retirar das ruas aqueles que possam causar dano à integridade dos demais.

Policiamento efetivo, fiscalização, campanhas educativas são importantes meios de que pode se utilizar o poder público para evitar problemas. Cerceamento à liberdade é autoritarismo, significa impor à coletividade padrões de convivência particulares.

É importante portanto que recusemos o toque de recolher e que medidas efetivas sejam cobradas da municipalidade para que nossos jovens possam desfrutar a vida social que, em consenso com os pais, entendam mais adequada.