domingo, 15 de novembro de 2009

Os “malditos” e os vassalos

Lucidez analítica e coragem argumentativa não são qualidades que geralmente possam ser atribuídas àqueles que têm se posto na imprensa como observadores do poder. Com exceção de meia dúzia de “malditos” (como são conhecidos os que de fato se expõem na mídia local), raramente lemos ou ouvimos algo que mereça reflexão. Às vezes até mesmo os editoriais chegam a lembrar a clássica redação do aluno da primeira carteira elogiando a professora, tamanha a falta de profundidade das “análises”, a eloquência das palavras e a subserviência em relação a quem manda.

Nas conversas informais não são poucos os que têm solução para os problemas da cidade e os que apontam erros dos antigos e dos atuais administradores, mas poucos são os que se propõem a ir à imprensa discutir com a comunidade. É que a exposição é um ato de coragem, um ônus que poucos se dispõem a pagar. Numa pequena cidade um texto mais incisivo, que mexa com interesses ou critique atitudes, pode gerar históricas rivalidades.

Alguns articulistas escrevem mil trivialidades, enchem os jornais de palavras que jamais serão lidas, em “análises” que se confundem com a própria propaganda oficial. Outros passam o que seriam suas ideias em trocadilhos impossíveis de entender e por meio de gracejos, sem dizer coisa com coisa, menosprezando a inteligência do leitor (e as regras de bom gosto). Na rádio, muitas vezes os entrevistadores usam seus convidados como mera “escada” para dizer o que eles, entrevistadores, desejam, de acordo com o momento que vivem com o poder municipal.

Nesse ambiente pouco animador, repleto de opiniões servis, as manifestações do ex-vereador Hélio Malheiros (DEM) e a participação do professor Mauro Cardin (PR) em recente audiência do orçamento participativo ganham destaque. Cardin ressaltou a postura de representantes da administração municipal nas reuniões com a população, que ele entende estar no plenário apenas como mera espectadora de “sessões de autoelogio”. O filiado do PR chegou a insinuar que a coordenação de tais encontros sequer cumpre o protocolo de bons modos.

Helio Malheiros, em reportagem ao JC, sugeriu a criação de uma ouvidoria na Prefeitura para que “houvesse maior interatividade entre a administração e a população”. A comunidade não se sente presente na Prefeitura. A pífia presença dos cidadãos nas sessões da Câmara, nos conselhos e nas reuniões abertas não mostra outra coisa. Na FAI a situação não é diferente.

Bem sabemos que a crítica causa mal-estar, mas ela é necessária, também porque temos atualmente na cidade uma oposição dispersa, enfraquecida, que sequer tem conseguido resolver suas mazelas. E o que pode haver de mais inconveniente do que um governo que se coloca como absoluto? O que pode haver de pior do que editoriais que colocam a cidade como um Éden cravado na Alta Paulista quando a realidade mostra que isso está longe de ser verdade?

Quem ocupa o poder público não pode estar alheio às “vozes da rua”. Como afirma Foucault, as ideias são tão pragmáticas quanto às ações, porque são elas que levam à ação.

sábado, 26 de setembro de 2009

Madame Lulu

Nesta semana esteve em Adamantina uma cartomante (muito parecida com Luciana Gimenez) cujas previsões políticas lhe renderam o título de maior autoridade brasileira no assunto. Diante de tais atributos (principalmente do primeiro), resolvi procurar a moça para saber as respostas sobre algumas coisas estranhas que andam acontecendo na cidade.

Chegando à elegante residência onde ela estava hospedada, precisei apertar a campainha várias vezes. Depois que o portão eletrônico abriu, apareceu um sujeito afeminado que foi logo perguntando: “Você tem hora marcada com madame Lulu?” Como me mostrei desentendido, ele disse: “É isso mesmo moço, se não tem, cai fora!” Mas uma voz aveludada veio da casa: “Dézinho, deixe o cronista entrar!”

Constrangido, acompanhei o “delicado” rapaz até a sala da famosa vidente. Madame Lulu pediu-me que não me importasse com Dézinho, pois ele estava perturbado com o caso do papagaio. Ela explicou: “Para ficar livre do papagaio do vizinho, que só vivia falando palavrão, Dézinho trancou o bicho no freezer durante três dias”. Quando perguntei se o loro tinha virado picolé, ela respondeu: “Não, quando abrimos o freezer, ele começou a gritar: “Viva a Caiuá!, viva a Caiuá!” Como se vê, a mulher nem bem chegou e já sabe direitinho a piada que rola na cidade...

Quebrado o gelo, Luciana Gimenez, digo, a bela cartomante, pediu que eu cortasse um baralho colorido, escolheu uma carta e disparou: “Eles deveriam saber que no dia da árvore precisariam plantar pés de arruda, comigo-ninguém-pode, espada de São Jorge e outras do gênero, e não patas-de-vaca!” E, apontando uma foto dos plantadores de pata-de-vaca completou: “Do jeito que os oposicionistas populistas estão mandando maus fluidos para essa gente, a escolha dessa espécie foi infeliz...”

Enquanto dizia, Lulu mostrava a foto do Diário do Oeste de terça-feira em que um alcaide, cercado de afetuosos auxiliares, enterrava uma muda. A vidente suspirou, buscou ajuda nos astros e previu: “Com esses olhares ternos das pessoas em volta, logo logo essas mudas virarão duas enormes árvores!” Disse isso visivelmente emocionada (Madame confessou-me depois, quando já estávamos íntimos, que uma das coisas que mais a emocionam é o jeitinho angelical das pessoas quando querem agradar. Ela me olhou profundamente e perguntou: “Você já imaginou como tudo seria diferente se essa também fosse a expressão desta gente ao lidar com os munícipes e com os subordinados?!...)

Percebendo a sabedoria de Lulu, perguntei sobre a candidatura de Cleusa da Pastoral em 2012. Depois de mexer o baralho, Lulu retirou uma carta e sentenciou: “Nem mesmo o depoimento do homem sem cinta, de camisa vermelha e que gosta de falar sobre jacarés vai impedir que a valente petista seja eleita prefeita em 2012”. Sabendo que algumas pessoas não iriam gostar da previsão, a bela desafiou: “Por que os políticos que não concordam com a candidatura da vereadora não fazem uma pesquisa de opinião com o nome dela para prefeita?”

Entusiasmado com as previsões de madame Lulu, comecei a imaginar a cara daqueles que andam dizendo que sou “vidente” no dia em que for realizada a pesquisa de opinião, proposta pela cartomante. Nisso a sensual voz de Lu me despertou de mais esse devaneio: “Você prefere Black Label com tônica ou com soda?” O que aconteceu em seguida eu conto depois... Fui.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Artigos e discriminação em Adamantina

A intensa liberalidade do mundo atual cria a falsa impressão de que os direitos individuais estão garantidos e que qualquer manifestação contrária não ganhará meia dúzia de adeptos. Mas a vigilância sobre o comportamento social se mantém como prática institucionalizada; a defesa do toque de recolher e a proibição de fumantes nos estabelecimentos comprovam a tese.

Em recente artigo um líder religioso escreveu no jornal Diário do Oeste: “O movimento homossexual continua a impulsionar suas ações, confirmando tragicamente a descida cada vez mais intensa para dentro da espiral mortal [...] A Suprema Corte de Iowa anulou a proibição do casamento gay em abril de 2009. É degradante! É o fim de uma civilização exemplar e decente.”

As palavras do religioso lembram os discursos de regimes totalitários, que defendiam uma concepção de sociedade perfeita e de homens perfeitos. Para esse gênero de discurso, qualquer comportamento contrário seria degradante. Anula-se o indivíduo e padroniza-se o pensamento. Se trocar homossexual por judeu, o artigo de Adamantina muito se assemelha à propaganda nazista.

A presente questão não deve centrar-se apenas no debate da homossexualidade, e sim no direito do indivíduo de escolher, por meio da própria racionalidade, o que entende ser melhor para sua vida. O religioso usa a liberdade de expressão para negar a liberdade sexual, ato íntimo e que diz respeito apenas à vida privada. Classificar como trágico e degradante o movimento homossexual é uma opinião que deve ser reservada a si mesmo, e não imposta a todos os adamantinenses que buscam um jornalismo tolerante e pluralista.

Daniele Hervieu-Léger, socióloga francesa, escreveu recentemente que “uma instituição religiosa não pode prescrever aos fiéis práticas e comportamentos que os conduziriam à contravenção das leis”. A figura do líder religioso tem um grande poder mobilizador, ainda mais em cidades interioranas. Suas palavras, muitas vezes, valem mais do que as das autoridades e dos familiares.

Por isso deve haver ponderação em certos assuntos, principalmente os que levam a práticas discriminatórias. O bullying nas escolas, as perseguições, os espancamentos contra homossexuais, são fatos reais que mostram o quanto essa questão deve ser debatida; o quanto esse tipo de preconceito deve ser desestimulado.

Brüno, mais recente filme do comediante Sacha Baron Cohen, ganhador do Globo de Ouro, satiriza o mundo fashion e a percepção da homossexualidade em certos grupos. Numa das cenas mais hilárias, o protagonista se encontra com um pastor que promete fazê-lo heterossexual. Quem assiste ao filme ouve com espanto os conselhos do clérigo americano. Mas as risadas constrangidas da plateia mostram que as absurdas ideias do filme podem estar mais próximas do que se imagina.

domingo, 20 de setembro de 2009

Adamantina, 2057

Sete anos depois do famoso discurso da inauguração do Bloco de Letras Aripuanã, o ex-prefeito e ex-diretor da FAI Professor Doutor Bruno Pinto Soares tem um novo e importante desafio pela frente: foi escolhido pelos colegas imortais da Academia Adamantinense de Letras para conduzir as cerimônias de desterro das propostas do I Fórum de Desenvolvimento de Adamantina, ocorrido em 2007.

Apesar da imensa expectativa na Praça Élio Micheloni, o historiador está sereno. Nem mesmo a longa oração feita minutos atrás por um octogenário ex-vereador famoso por cansativas rezas em cadeia de rádio consegue tirar a concentração do intelectual. E é assim, calmo como um padre franciscano, que Doutor Bruno dá o sinal para que os trabalhos de desterro se iniciem.

Após cavarem o duro chão da praça, seus discípulos encontram a resistente caixinha onde foram guardadas as tais propostas de 50 anos atrás. O octogenário ex-edil propõe nova oração antes da abertura da urna, mas o mestre de cerimônias faz ouvidos moucos e ordena a abertura do recipiente. Aí o bicho pegou pra valer. Explico.

Dentro da caixa, em vez das esperadas propostas de 2007, são encontradas várias carcaças de sapos com a boca costurada. E dentro dessas bocas, o nome de políticos que comandaram a cidade no início do século. O pânico se instala. Algumas pessoas saem em debandada, inclusive o octogenário ex-vereador petista, com sua surrada bíblia debaixo do braço. Mas Doutor Bruno, senhor da situação, dá inicio a mais um memorável e esclarecedor discurso:

“Senhores, acalmem-se, por favor! Saibam que há uma explicação para esses sapos: isso ocorreu porque velhos políticos que se intitulavam oposicionistas (mas que na verdade não passavam de populistas), numa de suas costumeiras trapalhadas trocaram o recipiente das propostas elaboradas no I (e único) Fórum de Desenvolvimento de Adamantina por uma caixa contendo um despacho de macumba encomendado ao saudoso Pai Chico.”

Depois de uma pequena pausa, o historiador puxa o fôlego e retoma seu discurso, ainda para falar sobre a oposição que existiu na cidade entre 2005 e 2012.

“Se alguém foi de fato oposição naquela época, esse alguém se chamou vereadora Cleuza da Pastoral. Ao contrário dos intelectuais e dos trapalhões populistas que pareciam usar os óculos verdes dos jumentos nordestinos (truque usado para fazer os animais acharem que folhas secas eram verdes), a brava petista sempre enxergava tudo o que ocorria na cidade, tanto é que acabou se elegendo prefeita em 2012.”

Continuando seu antológico discurso, Doutor Bruno recorda como nasceu o Rio Ganges de Adamantina: “Em 2012, alguns oposicionistas populistas, ao notarem que não tinham candidato para prefeito, sofreram sérios danos de saúde. Por conta disso, em 2013, a prefeita Cleuza mandou fazer uma lagoa no córrego Tocantins, na altura do Parque dos Pioneiros, e assim criou o Ganges adamantinense. Era bonito ver o ritual purificador de almas que os oposicionistas populistas faziam naquelas águas!”

“Bonito era, mas infelizmente de nada valeu, porque a oposição populista não prosperou. Há historiadores que afirmam que o fiasco se deu por falta de lideranças no grupo, mas a verdade parece estar com os estudiosos que afirmam que a oposição daquela época deu com os burros n’água, digo, não deu certo, porque um militante não suportava o outro.” E calorosos aplausos festejam a lucidez do orador.

“Obrigado, meus amigos, e tenhamos esses sapos apenas como um legado à posteridade da atrapalhada militância oposicionista adamantinense do começo do século!” Mais uma vez acalorados aplausos de uma plateia agora já completamente tranquila e conhecedora dos fatos históricos. “É verdade, depois que o chefe-mor dos oposicionistas populistas saiu do poder, eles perderam totalmente o rumo”, concordou um dos velhinhos que descansavam na generosa sombra da estátua da prefeita de 2013-2016.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Apenas um alerta

A manchete desta edição, “Aumento de portas para alugar assusta adamantinenses”, coloca na pauta o setor imobiliário, principalmente quanto a alugueis e compra e venda de construções residenciais e comerciais na cidade. Trata-se de simples constatação por meio de uma pesquisa cuidadosa, na qual foram percorridas todas as ruas cidade. O objetivo é o de alertar para um quadro que tem sido objeto de preocupação, principalmente entre aqueles que acreditam e investem em Adamantina.

Antes de tudo, não se pode falar em tendência na medida que os índices estão na faixa das oscilações sazonais, ou seja, das variações de mercado, principalmente levando em conta a crise mundial da economia. Adamantina não está isenta, como qualquer outra cidade de seu porte, dos reflexos da crise. Porém, o quadro deve servir de alerta para que isso não venha se transformar numa tendência de mercado.

Cabe ao executivo, legislativo e entidades de classe (ACEA, Sincomercio etc) avaliar, com frieza racional, a situação e tomar as providências necessárias. Neste sentido, destaca-se a missão do Conselho de Desenvolvimento da Cidade, designado pelo Executivo para implementar políticas de desenvolvimento socioeconômico adequadas aos anseios dos munícipes.
Portanto, o objetivo da reportagem é o de estimular respostas acertadas aos desafios que o presente impõe a todos.

Editorial - Jornal da Cidade - 14/09/2009

sábado, 12 de setembro de 2009

Adamantina, 2050

Estamos em 2050. O diretor da FAI, Professor Doutor Bruno Pinto Soares, se prepara para descerrar a placa de inauguração do Bloco de Letras Aripuanã, cujas alas vão receber os nomes de três ilustres educadores adamantinenses: Alfredo Peixoto, Mauro Cardin e Luiz Carlos Galvão. O mestre de cerimônias passa a palavra para o historiador. Emocionado, Bruno Soares, que, a despeito das polêmicas religiosas da juventude, agora é chefe da Pastoral de Comunicação da igreja local, dá início a seu histórico discurso:

“Senhores, antes de qualquer coisa, quero dizer que o nome Aripuanã, com o qual batizamos o novo bloco, tem um especial significado para mim, pois, foi em Rondônia, na Reserva Indígena Aripuanã, que os dois primeiros homenageados encerraram suas brilhantes carreiras acadêmicas. Mas voltemos um pouco no tempo para que todos conheçam a história desses dois mártires da educação.

“Corria o ano de 2012 quando Mauro Cardin e Alfredo Peixoto, desanimados com o resultado das eleições municipais, adquiriram suas motos Harley Davidson, modelo chopper, e caíram na estrada rumo a um projeto pedagógico na Amazônia. O objetivo era ensinar português aos filhos dos cupuaçuzeiros que habitavam as florestas daquela região.

“Diante da distância e dos riscos da viagem, os dois gastaram várias semanas nos preparativos. Depois que ficaram prontas suas vestes de couro, que muito lembravam as de Peter Fonda e Dennis Hopper no lendário filme ‘Sem Destino’, ambos partiram para aquelas que seriam suas últimas aulas.”

Enxugando os olhos, o grande orador e inesquecível ex-prefeito Bruno Soares (gestões 2017-2020 e 2021-2024) se recorda da ciumeira que teve de enfrentar por ocasião do lançamento de sua candidatura em 2016 e explica à plateia que, já em 2009, sua vitória eleitoral houvera sido profetizada pelos dois homenageados. E, com a voz embargada, continua: “Lamentavelmente, meus amigos, ao chegarem à Reserva Aripuanã, em Rondônia, nossos heróis foram capturados por ferozes índios cintalargas.

“Levados à aldeia, ambos foram submetidos a um cruel julgamento pelos pajés da tribo que, assustados com o símbolo de bandeira pirata da jaqueta do professor Alfredo, composto de caveira e ossos cruzados, tiveram a visão de que os educadores adamantinenses seriam a reencarnação de antigos inimigos antropófagos. Os nativos decidiram então resolver a questão ao modo tradicional, ou seja, na base da borbuna (porrete usado para matar garimpeiros) .”

“Essa homenagem é mais do que justa”, observam alguns alunos. “Por que será que esses dois nunca tiveram uma chance?”, perguntam-se uns poucos professores.

Após tomar um gole d’água, Doutor Bruno retoma seu discurso, agora para exaltar o mérito do terceiro homenageado.

“E saibam, meus amigos, que o professor Galvão, apesar de pequenas diferenças no modo de agir, também foi injustiçado. A começar pela perda da direção do partido político que mais amou. Isso aconteceu bem na época em que o grande professor e emérito político lutava por grandes projetos culturais, como a aquisição de livros em hebraico, japonês, latim, coreano e javanês para a biblioteca municipal. Outra coisa, vocês sabiam que a Academia Adamantinense de Letras também foi ideia desse inesquecível educador?

“Pois é, infelizmente, o destino também aprontou com o professor Galvão, que nunca imaginou que ser o primeiro presidente de uma academia de letras como a nossa era um enorme risco para a saúde.

“Agora que todos conhecem a história de nossos homenageados, declaro inaugurado o Bloco de Letras Aripuanã e suas alas Alfredo Peixoto, Mauro Cardin e Luiz Carlos Galvão. Obrigado a todos!” A seguir, Doutor Bruno faz demoradas reverências diante das imagens de santo do recinto e manda benzer as dependências. “O tempo é o senhor da razão!”, murmura o velho padre encarregado da tarefa. “O que disse, Padre?”, indaga o erudito. “Nada, nada...”, responde o quase centenário pároco local já iniciando sua sacra missão.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Uma vergonha...

Quem é que nunca reclamou das constantes quedas de energia em Adamantina. Como diz um leitor: “é só cachorro pensar em urinar no pé do poste que já cai a energia da cidade inteira”. O cidadão que paga corretamente por utilizar os serviços da Caiuá quer ser bem atendido. Imagine se você ficar sem pagar energia elétrica? A Empresa, após os trâmites burocráticos, com certeza, mandar-lhe-á um aviso de corte no fornecimento de energia elétrica.

Quem paga o prejuízo ao cidadão que teve perdas com a interrupção de energia elétrica? E quando há sobrecarga de energia, com queima de equipamentos eletrônicos, além de outros prejuízos? Se o cidadão não tem seguro residencial ou comercial, só será ressarcido no pólo judicial. A questão é sempre a mesma: nem mesmo chove, apenas um início de mudança de tempo já é suficiente para provocar interrupção no fornecimento de energia. Como exemplo, ontem, 07, por volta das 21 horas, houve uma queda abrupta, seguida de retorno da energia. Quantos não estavam trabalhando e foram surpreendidos com perda de textos ou coisa do gênero, além de outros prejuízos?

A Caiuá está em Adamantina desde final dos anos 40. Mas a impressão que se tem é a de que a sua tecnologia é quase a mesma daquele tempo. O pior de tudo é que, como tudo sugere, a Administração Pública e a Câmara quase nada tem feito para exigir da empresa respeito ao consumidor adamantinense. Salvo engano, a situação, quase sempre, acaba sendo relegada a plano secundário. Caso tivessem se empenhado à altura do problema, certamente, a situação seria outra. E, mesmo que tive tido ações para tentar superar este tipo de problema, pelas evidências do presente, foram pífias e ineficazes.

São situações desta natureza que acabam reforçando o sentimento, na população, de que o poder público, além de oneroso, está longe de atender o básico da condição cidadã dela. O que acontece em nossa cidade, relação aos serviços de fornecimento de energia, é uma vergonha que afronta a condição cidadã do adamantinense.

Editorial - Jornal da Cidade - 08/09/2009

domingo, 6 de setembro de 2009

Manifesto de um cronista

Começo meu manifesto parafraseando La Fontaine. “Críticos e políticos, principalmente os últimos, só dão atenção àquilo que querem ouvir e só acreditam na desgraça quando veem a cara que ela tem”. Mas não pensem os detentores do poder que uso tais palavras para provocá-los. Acontece que as questões a seguir podem ser debatidas por todos, no entanto só os políticos podem resolvê-las. Então é a eles que questionamos:

1) Quando será que os políticos adamantinenses vão entender que é preciso dar algum tipo de incentivo aos empresários que acreditam que a educação pode trazer mudanças positivas para a sociedade e, consequentemente, liberam seus empregados em horário de expediente para as atividades universitárias exigidas pelos cursos da FAI?

2) Quando será que os políticos adamantinenses darão destinação correta ao terreno existente ao lado da Camda, fruto de uma luta de vários anos do saudoso Dr. Cândido Jorge de Lima, deste humilde cronista e do petista João Grandão? Será que no local não daria para construir uma dessas creches modelo que o governo Lula anda distribuindo aos montes, uma vez que a EMEI da Cecap foi edificada ao lado do cemitério, portanto em lugar inadequado?

3) Quando será que os políticos adamantinenses vão entender a necessidade de contratação de enfermeiras para as creches, para ministrar medicamentos e prestar os primeiros socorros às crianças em caso de acidente? Aliás, em agosto de 2008 fizemos essa proposta à Prefeitura e, para resguardar o direito das educadoras das EMEI’s, encaminhamos cópia à Câmara e ao Ministério Público. Se tais justificativas não bastam, que tal lembrarmos a gripe suína?

4) Quando será que os políticos adamantinenses vão perceber que muitas leis municipais precisam ser revistas, pois da forma que estão atrapalham o desenvolvimento do município? Um exemplo é a lei sobre doação de terrenos (áreas comerciais ou industriais), que impede os empresários de fazer financiamentos com o menor juro dos últimos 40 anos. Detalhe, o professor Rogério Buchala está buscando legislação de outras cidades para adequá-la a Adamantina. Essa tarefa não seria de nossos políticos?

5) Quando será que os políticos adamantinenses vão criar coragem para desviar da cidade os caminhões de cargas fétidas que transitam por nossas principais ruas e avenidas? Em tempo: qual será o motivo que impede a Prefeitura de pôr em prática a alternativa (ao anel viário oficial) que meses atrás apresentamos para resolver essa lamentável situação?

6) Quando será que os políticos adamantinenses vão notar que a grande quantidade de imóveis com placas de vende-se ou aluga-se pode ser sinal de que alguma coisa muito ruim está para acontecer na cidade? Seria isso reflexo do aumento desenfreado de loteamentos no município? Ou seriam os primeiros sintomas de que é chegada a hora de dar mais dinamismo à nossa faculdade?

Encerrado o questionamento, agora faço um agradecimento e um apelo. O agradecimento é aos cidadãos que debatem e dão sustentação às minhas humildes considerações, especialmente os radialistas, que não têm medido esforços para propagar o que tenho escrito pelas ondas do rádio. O apelo é para que as forças políticas da cidade entendam que sou apenas um adamantinense que vê maior risco nas pedras menores, já que as maiores podem ser percebidas mais facilmente.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O que pensa o cidadão adamantinense?

Na última semana, após esperarem bem mais de 30 minutos na fila do banco, a insatisfação das pessoas era visível. Havia apenas um caixa. Não são muitos os cidadãos que sabem que no município, desde 2005, há uma lei regulamentando o tempo de espera nas filas. Mas o que pensa o cidadão adamantinense ao ver que, na prática, seus direitos não são respeitados?

A administração pública convoca os munícipes para participar de conselhos, reuniões sobre trânsito, sessões da Câmara, etc, mas o baixo comparecimento mostra a pouca importância que a população dá a esses encontros.

Por que a pessoa deixaria trabalho, família e lazer para participar de algo que não vê funcionar? Por que estar presente, se nos assuntos corriqueiros que lhe dizem respeito a atuação do poder público sequer é percebida?

O que pensa o cidadão adamantinense ao esperar tanto tempo numa fila? Ao passar por calçadas mal arrumadas pela concessionária de água e esgoto e saber que assim vão ficar? O que pensa ao saber que a lei que restringe a entrada de menores de 16 anos em certos locais muitas vezes não é cumprida? Que mesas tomam as calçadas mesmo sendo proibidas? Que filhos da classe média consomem drogas nas festas, mas os jornais só noticiam as apreensões feitas na periferia? O que pensa ao ouvir que seus representantes processam ou intimidam quem critica seu trabalho? O que pensa aquele que acorda de madrugada para ficar na fila do posto de saúde e muitas vezes é mal atendido no pronto-socorro? E ao ver a festa popular da cidade ser cancelada, enquanto Tupi Paulista, Junqueirópolis, Presidente Venceslau, Presidente Prudente e Barretos mantêm suas programações?

Muito se discute sobre a participação popular nos rumos de Adamantina, mas como trazer a população para as grandes discussões, se nas pequenas coisas ela não se sente representada? Assuntos como desenvolvimento da região, hospital regional e qualquer outro tema importante perdem a força sem a atenção do público.

Em Nova York, na década de 1980, uma das políticas para revitalizar a cidade era fazer o poder público presente. Nenhuma vidraça quebrada, nenhum prédio deteriorado, nenhum crime sem punição. A mudança de postura da população foi visível. Deu certo principalmente porque a comunidade se sentiu representada e aderiu à proposta.

Não se espera que o cidadão adamantinense pense em política depois de esperar em pé quase uma hora para pagar suas contas e de saber que muitas vezes as leis são letras mortas.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Pensando no exemplo de Botucatu

A proposta de renovação de contrato formulada pela Sabesp à prefeitura de Botucatu é emblemática. Cidade que, em 1974, era de 30 mil habitantes, com 10 mil ligações de água, hoje tem 110 mil habitantes, com cerca de 43 mil ligações. Claro, esse ritmo de crescimento é um dos responsáveis pelo interesse da Sabesp em Botucatu. Porém, isso não basta. Sabesp sabe da importância de Botucatu no cenário regional, principalmente no campo do ensino e da pesquisa, que vem sendo muito bem desempenhado pela Unesp, que já colocou a sua faculdade de agronomia e de medicina entre as melhores do país.

Diante disso, a direção da estatal (Sabesp) ofereceu 110 milhões de reais (equivalente a 1 milhão de reais para cada mil habitantes), além de outras vantagens para comunidade, como moeda de troca pela renovação do contrato para um período de 30 anos, com previsão de revisão a cada quatro anos. Por que isso? Algo deva ter despertado o seu interesse. Esse algo tem a ver com a expectativa de retorno que a referida renovação oferece. Questão de cálculo.

O mesmo se deve esperar em relação a Adamantina, que também indica ser uma cidade de aspiração regional. E nisso, Adamantina, espera-se, deve levar vantagem em relação a Dracena. Aqui tem Sabesp, lá não. Aqui tem FAI, lá não. Adamantina é a 3ª colocada da região de Prudente em volume de exportação, sendo superada apenas por Presidente Prudente e Presidente Venceslau.

Assim, seguindo o raciocínio aplicado pela estatal (Sabesp) a Botucatu, espera-se que, no mínimo, com uma população de 34 mil habitantes, que a renovação aquinhoa a comunidade adamantinense com no mínimo, 34 milhões de reais, além de outras vantagens. Porém, isto só vai acontecer se houver maior contundência do Executivo e do Legislativo nas negociações com a Sabesp.

Se ficar como anda a carruagem, Adamantina deverá assistir uma das maiores perdas de oportunidade de virar o jogo regional. Hoje, apesar de tudo, o jogo ainda favorável. Depois de assinado, só restam as lamentações de eventuais equívocos e omissões cometidos no processo.

Editorial - Jornal da Cidade - 31/08/2009

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Expectativa de uma grande avenida

A estrada intermunicipal, que liga Adamantina a Lucélia, não tem recebido tratamento adequado. Trata-se de uma vicinal que une duas cidades, que dista uma da outra não mais que cinco km. A população das duas cidades é de quase 60 mil habitantes.

Desde a sua pavimentação, no final dos anos setenta, nenhuma melhoria expressiva realizada. Quase sempre, aplicam-se precários serviços de tapa-buracos e de lama asfáltica, que apenas acabam remediando os problemas. Atualmente há trechos precaríssimos, com muitas crateras. Além disso, o acostamento, de ambos os lados, está tomado de buracos e capinzal, que torna ainda mais precária a segurança do tráfego.

Observe-se que é uma pista muito movimentada. Por ela, trafegam carros, caminhões, motocicletas, bicicletas, carroças e pedestres. Ressalte-se, também, que a vicinal é um trecho curto, se comparada com outras da região. Porém, apesar disso, tem sido muito mal-cuidada.

Sabe-se que a partir de janeiro próximo, o governo do Estado estará investindo na recuperação de vicinais da região de Adamantina, totalizando de 20,8 km previstos, num investimento de R$ 7,8 milhões. Espera-se, portanto, que a vicinal Adamantina-Lucélia receba o tratamento merecido. Ela tem tudo para se tornar uma avenida, com mão dupla, bem sinalizada, e com uma iluminação adequada em toda sua extensão.

Um dos maiores beneficiados desta conquista seria o comércio de Adamantina. Porém, isso só será possível se houver um trabalho político a altura da expectativa. É o que espera a população.

EDITORIAL - Jornal da Cidade - 24/08/2009

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Apenas três suspeitas... Será?

“O Brasil é um asilo de lunáticos onde os pacientes assumiram o controle”, Paulo Francis.

Na tarde de sexta-feira, 20, uma estudante de apenas 19 anos foi internada na UTI da Santa Casa de Adamantina com suspeita de Gripe A (H1N1).

Este seria o terceiro caso suspeito na cidade: um homem de 57 anos estava internado, mas seu estado clínico melhorou e uma mulher de 36 anos faleceu na última semana. Duvido que estes sejam os únicos casos suspeitos em Adamantina.

A segunda suspeita, só foi noticiada após a primeira morte. Apesar da insistência da imprensa em obter informações e alertar à comunidade – ainda mais – sobre a doença. Mesmo assim, as autoridades locais “lavaram as mãos” e permitiram eventos públicos com grande aglomeração de adolescentes.

Não podemos parar de viver, é obvio, no entanto, como dizia minha avó “caldo de galinha e precaução não fazem mal a ninguém”. Enquanto isso, autoridades de Osvaldo Cruz – mesmo equivocadas – divulgaram um ‘pseudo-caso-confirmado’ e alertaram a população. Dias após, identificaram um ruído de comunicação e corrigiram a informação.

Aqui, a ‘cortina de fumaça’ continua. No jogo de bastidores, a população é prejudicada pelo ‘medo’ de divulgar e pela presteza em ‘omitir’.

Há algum tempo, atuava em um jornal de Adamantina quando noticiei o pior índice de mortalidade infantil da história da cidade, dados assustadores, semelhantes aos encontrados em países da África... Eram dados oficiais, porém, muitos ‘poderosos’ ficaram raivosos com a divulgação de tal informação.

Depois disso, senti na pele ou nas páginas, como preferir, o poder do controle da informação. Naquela época, buscava todos os dias da semana obter uma única informação, entretanto, apenas um jornal a conseguia.

Estava instaurado o novo sistema de direcionamento e manipulação. Antes, atuavam como censores nas redações, agrediam psicologicamente, agora, controlam a informação e a direcionam como querem e a quem preferem.

A informação saía das “salas brancas” direto para as páginas do ‘jornal escolhido’. Nenhum questionamento, nenhuma vírgula alterada, nada. Apenas o nome do autor era alterado (pra não dar na cara, é lógico!). E, apesar da “orientação expressa”, a assessoria de imprensa, muitas vezes, lia a matéria depois de publicada ou se curvava à grosseria do ‘poderosão’.

Sei disso porque, durante este processo de controle de informação, trabalhei no ‘jornal escolhido’ e presenciei esta atrocidade. O jornal não tem culpa, afinal todo veículo de comunicação luta para ter exclusividade. A grande mídia até paga!

Dito isso, somente um fato poderá sanar minhas dúvidas quanto ao número de casos suspeitos de Gripe A (H1N1) em Adamantina: analisar o registro de distribuição de medicamentos à base de Oseltamivir (Tamiflu). Caso contrário – com dos fatos citados acima –
duvido!!!!!

Everton Santos - Jornalista
Artigo publicado no Jornal da Cidade - 24/08/2009

sábado, 22 de agosto de 2009

Uma receita e um resumo

Depois de muito refletir sobre os incidentes envolvendo alguns políticos da cidade, cheguei à conclusão de que está na hora de lhes receitar um poderoso remédio: a milagrosa dieta do maracujá. Mas não pensem os leitores que estou de gozação com os queridos cidadãos, pois o que não desejo para mim não desejo para os outros.

No entanto, essa dieta milagrosa exige algum sacrifício. Feita a ressalva, vamos à receita: 1) O doente precisa acordar antes do sol nascer para, ainda em jejum, tomar o suco de sete maracujás sem açúcar e com as sementes trituradas. 2) No almoço deve comer sete pés de alface temperados com sete colheres de vinagre de maracujá. 3) No jantar repete-se o cardápio. Se tudo correr bem, na noite do sétimo dia de tratamento (que dura sete semanas) o doente pode comer sete colheres de mousse da mesma fruta e tomar uma colher de mel.

Agora com a consciência mais tranquila por essa dica para relaxar os nervos do pessoal que tem visto motivo para briga em tudo, vejamos os fatos que marcaram a semana. Na segunda, por falta de energia elétrica, a sessão dos vereadores, realizada em parte sob a luz de um romântico farolete, transcorreu na mais perfeita harmonia. O lirismo da histórica noite só não foi maior porque alguém, depois de arrolar fortíssimos argumentos, se autoproclamou “presidente” de certa bancada parlamentar. Comenta-se que tenha sido essa bombástica declaração que queimou o transformador da Caiuá, o que é mera especulação.

Mesmo sem o romantismo da sessão legislativa, dois outros fatos também são merecedores de registro: o depoimento de valorosos vereadores na delegacia de polícia sobre o famoso caso das telhas e a publicação, lado a lado, da réplica do “capitão” do Íbis e da tréplica do “presidente” do Cosmos, na polêmica discussão sobre o futuro de nosso saneamento básico. Pelo visto está aí mais uma queda de braço que não vai ter vencedor.

Enquanto isso, a popularidade da “presidente” do Palestra da Alta Paulista continua crescendo. Até abaixo-assinado pedindo sua volta à direção da equipe que liderou por mais de três anos vem sendo articulado por ex-comandadas. Quem não vem tendo a mesma sorte é o meiocampista do Íbis que já foi presidente da Câmara duas vezes. Apesar de ser muito habilidoso, no atual esquema tático da equipe o craque não tem vez. A bola continua sendo lançada da defesa para o ataque sem passar por ele.

Enfim, meus amigos, por esse resumo dá para notar que a semana não foi das piores e que encerro minha crônica sem falar do “Faz-me-rir”. É que o time dos partidos nanicos não gerou nenhuma novidade que mereça ser mencionada; aliás, o “Faz-me-rir” não vem acertando um lance, sai mal na foto (Ririri!...) e há muito tempo sequer consegue fazer a bola passar do meio de campo. Fui.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Refém da Sabesp

Por mais que faça, a Sabesp sempre vai ser devedora à população adamantinense, mesmo que troque toda a tubulação e integralize o sistema de tratamento de esgoto. Sabe-se que desde maio de 1977, a referida empresa vem explorando os serviços de água e esgoto do município.

Apesar da tarifação do esgoto em 80% do valor da água consumida, somente em 1998 é que a Sabesp resolveu construir a 1ª lagoa de tratamento no setor leste, no córrego Oriente, responsável por 38% da rede. Isso depois de muita pressão da Apromam e do Ministério Público, sob atuação da então promotora de justiça, Elika Kano, com intensa participação da mídia local. Na ocasião, disseram que em breve ocorreria a construção da 2ª lagoa, no setor oeste, que estaria integralizando o sistema de tratamento. Porém isso não aconteceu. A luta continuou e só por força de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), firmado com o Ministério Público, sob a condução do promotor de justiça, José Augusto de Barros Faro, é que a Sabesp resolveu construí-la. Há de se lembrar que o convênio venceu em setembro de 2007.

Há também de se destacar a dissimulada atuação da Administração Municipal. Desde 2005, quando assumiu o comando, pouca importância tem dado ao assunto. Tanto o é que somente, de última hora, em meados de 2007, resolveu designar uma comissão de trabalho com o fim de estudar o assunto. Porém, apesar dos esforços de membros, a impressão que ficou é a de que tudo foi feito para “inglês ver”. Cada vez mais, fica claro que a estratégia adotada pela Administração é a de fazer a renovação do contrato, com o menor desgaste político possível.

Hoje, às portas da renovação, simplesmente a população encontra-se refém da Sabesp. Certamente com o aval da Câmara, sem alternativa, vai ter que continuar a pagar tarifas superiores, em média 50% a mais, em relação, como exemplo, às de Garça e de Penápolis, que têm sido modelo no setor. Além disso, como está, a população vai ter que arcar com as conseqüências de um processo que, até agora, se mostrou favorável, de forma desproporcional, à Sabesp, sem nenhum ganho concreto para o interesse da cidade.

EDITORIAL - Jornal da Cidade - 17/08/2009

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Ainda sobre política e futebol

Quem disse que política e futebol formam uma mistura explosiva tem razão. As últimas desavenças na cidade comprovam a tese. A propósito, o “pequeno” incidente ocorrido na última sessão de vereadores e a carta aberta sobre saneamento básico do “capitão” da equipe que certos filósofos dizem parecer o Íbis Sport Club, fizeram alguns cartolas repensar as estratégias para o campeonato de 2012.

Com os novos desacordos, agora os dirigentes do (quase ex-) Time dos Sonhos fazem de tudo para impedir que a equipe repita a desastrada história do Cosmos de Nova York. Explico.
Na década de 70, apesar de ter os melhores jogadores do mundo, inclusive Pelé, o time norte-americano nunca ganhou nada importante. Sua curta existência se resumiu a alguns títulos no fraco campeonato ianque e a jogos “exibição”.

Mas ainda é cedo para afirmar que o campeonato de 2012 vai ser decidido entre o Íbis Sport Clube e o Cosmos de Nova York (também conhecido como Time dos Sonhos). Isso porque pintou novidades. Mais duas equipes vêm sendo formadas, e elas podem complicar a vida dos atuais favoritos ao título.

No comando de uma dessas equipes está uma ex-secretária que virou ícone do elenco de futebol feminino que ela dirigiu por mais de três anos. Ainda hoje, “muitas” atletas (que também são educadoras) pedem sua volta ao cargo que ocupou até abril de 2008. E, sendo “Verde” a cor desse time, a agremiação foi batizada de Palestra da Alta Paulista. Dito isso, vamos à quarta equipe.

Gilmar, Oreco, Valmir, Jaime e Sidnei; Ari Clemente, Miranda e Abib; Joaquinzinho, Da Silva e Neves. Essa formação do Corinthians ficou conhecida no ínicio da década de 60 pelo apelido de “Faz-me rir”. A equipe era tão ruim que, depois de apanhar de 7 x 0 da Portuguesa, o legendário goleiro Gilmar deixou o Parque São Jorge em seu DKW (espécie de Fiat 147 da época, ops!) e foi para o Santos.

Recordo esse capítulo da história do Timão para dizer que em homenagem ao elenco alvinegro do início dos anos de 60, a quarta equipe que está sendo treinada para 2012 vai se chamar “Faz-me rir”. Esse time será formado pelos partidos nanicos e terá como estrelas alguns “jogadores” que não raro aparecem em fotos nos jornais agarrados ao pescoço de honestíssimos políticos, como se tais personagens fossem a taça Jules Rimet. Aliás, um de seus principais jogadores recentemente posou feliz da vida abraçado a Paulo Maluf, como se o rei das contas na Suíça fosse um troféu.

Depois dessa proeza, o craque tem tudo para ser aclamado capitão da equipe do “Faz-me rir” em 2012. Essa vantagem que a foto com o ex-hóspede da Polícia Federal dá ao craque do “Faz-me rir” só poderá ser anulada se alguma outra celebridade do gênero, como Celso Pitta ou Renan Calheiros, aparecer por aqui e um outro jogador do “Faz-me rir” resolver abraçá-lo diante das lentes dos cronistas sociais da cidade.

Enfim, caro leitor, agora que você sabe que o campeonato de 2012 será disputado por Íbis, Cosmos (ex-Time dos Sonhos), Palestra da Alta Paulista e Faz-me rir, o resto é com você. Quanto a mim, já que as coisas andam de mal a pior para quem escreve crônica em Adamantina, mais uma vez encerro um texto sem saber se vai ter outro na semana que vem. Fui.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Onde estavam os vereadores de Adamantina?

No último sábado, vereadores de várias cidades se reuniram em Dracena para discutir problemas da região. O encontro propôs formar uma associação na Nova Alta Paulista, com o objetivo de favorecer a discussão dos assuntos regionais com o legislativo estadual e implementar medidas que visem o progresso dos respectivos municípios.

Estiveram presentes vereadores e 11 presidentes de câmaras municipais. Osvaldo Cruz, Lucélia, Tupã, Mariápolis, Pacaembu e outros municípios vizinhos se fizeram representar. Na ocasião foram debatidas questões como o impacto das penitenciárias e a importância da nova entidade. É uma reunião que mostra maturidade. Mas onde estavam nossos vereadores?

Não se pode pensar em coordenação regional sem a participação de Adamantina. Uma cidade que se orgulha de ser polo educacional, referência na área cultural e de eventos, de ter um atrativo comércio e de contar com políticos bem relacionados com deputados não pode ficar alheia a tais acontecimentos. A rigor, deveria encabeçar os esforços para a sedimentação da nova instituição.

É provável que nossos vereadores tenham tomado conhecimento da reunião, feita num final de semana para facilitar o comparecimento. Ou nossos edis não foram convidados para o evento? Se isso ocorreu, trata-se de uma demonstração de desprestígio do legislativo local. Caso o convite tenha sido feito, por que não se enviou um representante?

Raros são os momentos em que os políticos da região deixam as diferenças de lado e decidem trabalhar em conjunto. A própria associação de prefeitos, a AMNAP, tenta sair dos anos de apatia. Adamantina perde a oportunidade de se colocar à frente das discussões regionais e de se lançar como força representativa. Numa época em que os grandes líderes mundiais trabalham de forma coordenada e buscam tomar decisões em conjunto, nossa cidade falta a um encontro de agregação de forças. É uma pena!

A ausência de nossos representantes nos faz acreditar que ou há apatia ou há supervalorização de Adamantina nos assuntos regionais. Depois da perda de verbas, de instituições e de benefícios para outras cidades da região, sobram as costumeiras justificativas, mas elas não resolvem. O que precisa de fato é uma atuação forte e voluntariosa de nossos políticos para impedir que perdas maiores ainda venham a ocorrer. Que se comece pelo envolvimento dos vereadores nos fóruns regionais, nos quais não só mostrem espírito de luta, como também disposição para liderar todo e qualquer esforço em favor da região.

A mágoa em cidade pequena


Desde menino o senhor Ressentido mora na mesma cidade. Em 1982, ele e Pedro tiveram um atrito; hoje quando ele cruza com Pedro, finge que não vê. Em 1984, João apoiou um mau político adversário de Ressentido só para tirar vantagem; desde então, Ressentido o despreza. Em 1987, Ressentido ouviu dizer que Tião falou mal dele; como já tinha havido um boato desses em 1979, ainda hoje Ressentido não entra onde Tião esteja. Em 1991, Paulo fez pouco-caso de Ressentido, que a partir daí não quer vê-lo nem pintado de ouro...

Essas mágoas, mais as da infância, as da vida de moço e uma infinidade de outras foram se acumulando até fazer de Ressentido um amante do quarto escuro, do telefone mudo e do muro alto.

O fato é que, numa pequena cidade, onde as mesmas pessoas frequentam os mesmos espaços a vida inteira, o ressentimento é mais presente e incômodo. Quanto menor o lugar, mais mágoa. A pequena comunidade em que a amizade une a todos num laço comum de bem-querer até existe, mas na imaginação de quem vem da capital passear.

Está certo, a mágoa é uma defesa natural como qualquer outro instinto, mas não deixa de ser de boa estratégia relevar certas coisas e conviver com todos, mesmo que se tenha maior aproximação só com alguns poucos escolhidos. Falo aqui de conveniência, não de perdão, palavra que apenas designa uma nobre intenção. Calar a mágoa talvez seja algo para uma espécie bem superior à nossa.

Se o rancor diminui é porque a pessoa que magoou perdeu a importância para o magoado, não porque ele decidiu perdoá-la. Quem tem poder sobre os próprios sentimentos? “Engana-se aquele que acredita que os grandes personagens possam esquecer as velhas injúrias em virtude de novas vantagens”, disse Maquiavel. É verdade, mas ele se enganou em restringir-se aos grandes personagens. Por acaso, os “pequenos” personagens pertenceriam à mesma espécie dos ursinhos de pelúcia?

No sentido que dissemos, perdão, esquecimento e descaso são sinônimos e nenhuma dessas palavras tem relação com bondade ou maldade. A pessoa que convive apesar da mágoa é aquela que entende que a mágoa não precisa impedir o relacionamento com alguém; até porque ela também precisa da tolerância dos outros. Não é boazinha, mas apenas uma pessoa prática, que gosta de si mesma e de ver as coisas andarem. E, convenhamos, a tolerância não só é um esforço em favor do bem comum como também uma demonstração de civilidade.

domingo, 2 de agosto de 2009

Medida necessária?

A formação do historiador levanta a cautela no posicionamento em fatos recentes. Condicionado pelas circunstâncias a análise racional pode ficar comprometida, o que equivale deixar-se levar pela paixão. No entanto, cabe ao articulista pensar o presente e não se esquivar dos assuntos importantes para a comunidade.

Semana passada ganhou destaque em Adamantina a suspensão das atividades escolares em decorrência da possível contaminação dos alunos pelo vírus H1N1, conhecido como gripe suína. Afirmo “possível contaminação”, pois não foi registrado nenhum caso da doença na cidade.

Algumas escolas, por determinação da Secretaria da Educação do Estado, prorrogaram o início das atividades. Mas as medidas referentes às escolas municipais, colégios particulares e a FAI foram tomadas pelas autoridades locais. O cancelamento das aulas pode ser precipitada, pois criou-se na cidade uma sensação alarmista, mesmo sem motivo aparente.

Não se fundamenta a justificativa das autoridades e da direção da faculdade quando afirmam que os alunos, moradores de outras cidades e estados, podem trazer o vírus ao município. Daqui duas semanas a chance de contágio não será a mesma ou até maior? Os estudantes que ficaram em suas cidades continuarão correndo o risco de contaminação. A medida teria eficácia preventiva se nossa região contasse com inúmeros casos. Não é o que ocorre.

Seguindo a recomendação da Secretaria Municipal de Saúde, as escolas particulares também cancelaram suas atividades. A sensação de alerta tomou conta da cidade. Apesar de nenhum caso registrado, quase não se encontra o remédio destinado ao tratamento da gripe nas farmácias, mesmo o produto tendo alto custo. Muitos correram em busca do álcool em gel e mães preocupadas não querem mais que seus filhos se reúnam com outras crianças. Nas conversas informais o tom é de apreensão.

A mídia e as autoridades federais reforçam que a gripe suína não representa grande risco a população. Lavar as mãos com frequência e não colocá-las nos olhos, boca ou nariz já são suficientes no atual estágio. Em recente entrevista, o ministro da Saúde José Gomes Temporão afirmou que 99,6% das pessoas que contraem o vírus não serão afetadas, pois as defesas naturais do corpo se encarregam de combatê-lo.


O cancelamento das aulas em áreas de alto risco é uma medida de impacto positivo, caso que não se enquadra Adamantina. Não há motivo para tal medida. Campanhas nas escolas e na mídia local teriam maior efeito. Nossas autoridades precisam pensar a cidade em sua realidade e tomar posições condizentes com os fatos. A suspensão das aulas e a discussão sobre o toque de recolher mostram que há uma disposição aos modismos e a fraca análise da conjuntura local. Não é isso que se espera daqueles que tem o destino da cidade em suas mãos.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

A fila dos bancos

Poucos são os momentos de isonomia entre os brasileiros. Num país conhecido pelas grandes desigualdades e pela clara diferenciação entre as classes sociais, as filas são um dos poucos momentos verdadeiramente democráticos.

Nos supermercados, lotéricas, bancos, farmácias, estabelecimentos de lazer, aeroportos, não existe distinção de gênero, credo ou etnia, salvo os atendimentos preferenciais aos idosos, gestantes ou portadores de deficiência. Contudo, as filas dos bancos são um martírio, principalmente para o trabalhador que não tem tempo durante a semana e precisa sacrificar seu horário de almoço. Essenciais para a população, a maior parte dos bancos não oferece um atendimento nem mesmo satisfatório.

Uma rápida passagem pelas agências da cidade mostra as dificuldades por que passam as pessoas. Não menciono nem o tempo de espera, que já foi regulamentado pela lei estadual 10.993/2001, e raramente é cumprida. A discussão a que me remeto é a das condições a que são submetidos os que esperam para pagar suas contas.

A falta de fiscalização em Adamantina gera transtornos inadmissíveis. Filas desorganizadas que às vezes chegam às escadas e até mesmo à rua, colocando as pessoas ao sol, e morosidade no atendimento. Como se sabe, após a venda do Banespa para o grupo espanhol, outra instituição assumiu a folha de pagamento do servidor estadual.

Mas em Adamantina essa instituição não adotou as medidas necessárias para atender ao acréscimo de demanda. Caso semelhante ocorre no banco que se orgulha de estar completando 201 anos, mas que, com reduzido número de caixas, é um dos que mais demoram em Adamantina.

Outro ponto problemático diz respeito ao banco que ganhou a licitação da folha de pagamento do servidor municipal. Apesar de a demanda ter aumentado, parece que pouco esse banco investiu no bem-estar dos usuários de seus serviços e que esperam em pé por um tempo muito longo. Outra questão é o chamado “atendimento preferencial”, que em alguns bancos da cidade deixa idosos e gestantes em pé por mais de 15 minutos, descaso já fartamente conhecido dos vereadores.

Em 2005, os edis Cleusa Francisco e Celso Mastellini, por meio da lei nº 3.140, tentaram regulamentar a situação visando “dar atendimento digno e profissional aos clientes”, mas nem todas as agências locais cumprem essa disposição. Se existe lei, e ela não vem sendo cumprida, cabe ao poder público fazer com que o seja, porque de seu cumprimento dependem milhares de adamantinenses.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Toque de recolher: a terceirização da autoridade

O pensador inglês Thomas Hobbes, pressupondo que a natureza humana seja predatória, defendeu um governo forte e centralizador que pudesse conter os ímpetos individuais e instituísse severas penas àqueles que fugissem às regras e aos costumes ditados pelo príncipe. O monarca, escolhido dos deuses, saberia o que seria melhor aos súditos.

Platão já delegara aos filósofos a plena direção da cidade; criou uma “ditadura aristocrática” pela qual os mais aptos guiariam a plebe. Salvo raros momentos, a humanidade sempre teve defensores da forte regulamentação da conduta humana. Esse pensamento parte da ideia de que o cidadão comum deva ser guiado como um portador de necessidades especiais numa rua movimentada. Os “olhos do Estado” conduziriam a grande massa, que não sabe se portar.

De tempos em tempos esse preconceito ressuscita. Partindo-se do que deve ser o “costume correto”, fazem-se leis tendenciosas, muitas vezes inspiradas em modismos, sem uma reflexão mais acurada. Formulam-se comportamentos padronizados, os quais todos devem acatar. Nessa liberalidade enquadra-se o toque de recolher.

Alguns legisladores e uns poucos formadores de opinião, partindo de convicções pessoais sobre a conduta correta da juventude local, classificaram como providencial a limitação de horário para a presença de adolescentes nas ruas da cidade. Alguns pais, usando a lei como muleta pedagógica, sentem-se amparados pela participação do Estado na criação dos filhos. E corre-se o risco de se terceirizar a autoridade.

A liberdade individual e a vida privada são fundamentos da democracia. Autorizar o poder público a regular a criação dos filhos é perigoso, pressupõe que os pais não podem fazê-lo e que seus filhos devem ser tutelados. O Estado de fato tem o direito de regular a conduta dos cidadãos, mas desde que haja alguma infração ou exista risco para o indivíduo ou para a comunidade. A imposição de horários para circulação de pessoas nas ruas infringe o direito de ir e vir, o que é concebível apenas em situações de exceção.

O toque de recolher é uma medida paliativa para cidades que têm sérios problemas de violência e drogas, o que não é o caso de Adamantina. Já existem outros mecanismos para regular a vida dos jovens da cidade, que saem à noite com a concordância dos pais. E é dever dos órgãos públicos municipais fiscalizar a entrada dos adolescentes em estabelecimentos inapropriados à sua idade, bem como retirar das ruas aqueles que possam causar dano à integridade dos demais.

Policiamento efetivo, fiscalização, campanhas educativas são importantes meios de que pode se utilizar o poder público para evitar problemas. Cerceamento à liberdade é autoritarismo, significa impor à coletividade padrões de convivência particulares.

É importante portanto que recusemos o toque de recolher e que medidas efetivas sejam cobradas da municipalidade para que nossos jovens possam desfrutar a vida social que, em consenso com os pais, entendam mais adequada.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Da escravidão às cotas raciais

Como de costume, 13 de maio, dia em que foi assinada a Lei Áurea em 1888, passou despercebido em quase todo o Brasil. Fora do calendário oficial, a abolição se tornou mais um fato colocado no rodapé da história, que pouco ou nada diz às pessoas. A questão dos feriados no Brasil é fato que merece atenção. Longe de escolhas aleatórias, as datas comemorativas servem para legitimar opiniões e construir a consciência nacional.


O Brasil foi o último país da América a banir o trabalho compulsório e a oficializar o princípio jurídico da igualdade. Reivindicada pelos ingleses, que queriam ampliar seu mercado consumidor, e pela intelectualidade nacional, que via a escravidão como um entrave à modernidade, a abolição foi a ruína da base política do Império e mal assimilada por setores da tradicional elite escravista. Muitos não viam com bons olhos a ideia de trabalho assalariado.


Na época, o real significado da lei para a população escrava não foi mensurado. Sem teto e escolaridade, milhões de libertos perambularam pelas principais cidades à procura do que fazer. De um lado, sufocada pelo estigma da indolência e do atraso; de outro, pela onda de imigrantes europeus que aportavam no país, a grande massa negra se viu marginalizada nas décadas iniciais da República. Restavam-lhe os subempregos e as periferias.


Até 1970, 90% da população negra do Brasil era analfabeta. Segundo muitos, embasados em teorias meritocráticas, a condição do negro é condizente com a pouca aptidão para assuntos intelectuais. Nessa perspectiva a análise não se assenta na sociologia, e sim na genética. Questão defendida pelos eugenistas, a idéia da inferioridade negra sobrevive de forma latente na sociedade brasileira, fato comprovado em alguns minutos de conversa em qualquer roda de “esclarecidos”.


Segundo o último censo étnico racial da Universidade de São Paulo, apenas 1,3% de seus 38.930 alunos de graduação se declara negro. Na Bahia, onde 70% da população são negros, apenas 4% dos estudantes de medicina afirmam pertencer a essa etnia. Menos de 15% dos brasileiros com ensino superior completo são negros. Nesse aspecto, a exclusão racial é paralela à social, já que a maioria desse segmento étnico compõe-se de famílias de baixa renda.


Algumas políticas estão sendo implementadas pelo governo federal e pela sociedade organizada para a inclusão dos negros em espaços antes exclusivos dos brancos. As cotas raciais estão nas universidades públicas, nos desfiles de moda, na televisão, nos debates políticos. Contudo, muitos veem esse esforço apenas como um paliativo segregacionista que pode dar margem a uma divisão racial no país.


O fato é que os 350 anos de escravidão negra no Brasil ainda geram graves injustiças. A busca de alternativas para minimizá-las demorou para começar: restrito aos meios políticos e acadêmicos e às camadas mais esclarecidas da sociedade, o debate sobre a definitiva inclusão de nossa população negra ainda não ganhou as ruas. Os três séculos e meio de escravidão continuam a dividir os brasileiros entre os que servem e os que são servidos, levando-se em conta apenas a cor da pele.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

O garanhão paraguaio

Dias atrás, a mídia noticiou algumas das peripécias amorosas do ex-bispo da Igreja Católica, e hoje presidente do Paraguai, Fernando Lugo. Até agora três mulheres afirmam ter mantido relações sexuais com o ex-clérigo antes mesmo de ele renunciar ao episcopado, fato consumado para que pudesse assumir o governo.


Duas questões importantes devem ser analisadas. Em primeiro lugar a discrepância entre teoria e prática no que tange ao discurso e dogmas católicos. Não bastasse quebrar o voto de castidade, Lugo afirmou que uma das mulheres usava o DIU e que uma “falha” desse dispositivo teria levado à gravidez.


O uso de métodos anticoncepcionais é uma das mais fortes bandeiras da Igreja Católica na atualidade. A Campanha da Fraternidade de 2008 teve como lema “Escolhe, pois, a vida”, numa verdadeira cruzada contra a camisinha, o aborto e as pesquisas com células-tronco. Se nem os defensores da ideia a seguem, como pregá-la ao “rebanho”? Pelo menos desta vez a relação foi consensual e não mais um caso de pedofilia, escândalo que já se tornou corriqueiro. Mas essa não é a única questão.


O Paraguai é um dos países mais pobres da América. Encontra-se, segundo dados da ONU, em 95º em Índice de Desenvolvimento Humano, 71º em alfabetização e 75º em mortalidade infantil. Ostenta também um pífio desenvolvimento industrial e sérios problemas de concentração fundiária e de renda.


Mas os problemas pessoais e até instintivos, no caso de Lugo, se sobrepõem aos problemas de maior importância. A polêmica levantada fornece farto material para a mídia sensacionalista. E esse fato não é singular apenas aos nossos vizinhos.


Um destacado intelectual adamantinense, munido do que ele entende como “ética protestante”, acredita que a vida pessoal do homem público está atrelada ao seu cargo. Segundo esse pensamento a pessoa pública deve dar explicações sobre sua conduta à sociedade. Contudo, ancorado em pouca experiência e menor capital cultural, acredito que a vida privada é algo inviolável, e não domínio público, mesmo que os envolvidos o sejam.


O caso do garanhão paraguaio é mais um exemplo de uma sociedade em crise de paradigmas, fundamentada na defesa de dogmas ultrapassados e anacrônicos, os quais nem mesmo seus defensores seguem. Demonstra também uma mídia obcecada pela vida privada e pelos bastidores, deixando a ética e o bem público apenas nos mal consultados manuais de jornalismo.